terça-feira, dezembro 07, 2004

Ergue


Mars TM National Geographic 2003



Ergue-se. Começa a cair e sai de mim em velocidade cruzeiro. A rapidez é tanta que não tenho consciência da falta que me faz ser feliz. Só o momento conta. O momento em que tudo à minha volta gira e roda e me separa das estrelas. Me aproxima delas.
Dor.
A chuva nas nossas caras numa noite fresca de Verão. Caem que nem sementes no teu umbigo. O teu umbigo. Que me habituei a beijar, a mordiscar. Sei que queres e não podes. Que as nossas preces se concretizaram noutra vida, não nesta. Sei que andas faminta de amor, carinho, chuva na tua cara. Para te sentires melhor que eu.. Melhor.

Tiras o cachecol e falas contigo ao mesmo tempo que te digo para seres tu a falar. Conheces cada gesto, cada gota do meu suor. Canso-me de te tentar vencer, de tentar sequer beliscar-te de amor e sentimento. Não falas. Não mexes. Nem sequer gritas o meu nome dentro do carro que compraste a crédito. E que puseste em meu nome. Só para poder dizer a toda a gente que o carro “é meu! Comprei-o ontem, não é lindo??”. Nunca mais me levanto. Nunca mais me levanto e dou um pontapé no gato. Nesse estúpido gato que me ofereceste para substituir as tuas ausências. Os gatos não têm amor para dar. São como tu. Quase. Tu não tens mesmo amor para dar.

Erguer.
Começar a erguer o sentido que deste à minha vida.

As nuvens em espiral no desembaraço dos teus braços emaranhados à minha volta. Como teias desejosas de um amor profícuo. Inerte. Opaco e belo. É como me sinto a dizer-te não. Só te disse duas vezes. Não. A primeira foi quando me perguntaste se tinha deixado de ter prazer contigo. Não. A segunda foi agora.

Quando ias ao café para te consolares com o tabaco que compravas com sofreguidão. Quando lá ias sentia-me preso por não precisares de mim. Ias e vinhas com a leveza própria das penas que embalam o amanhecer em que adormeço. Passava a noite a ver-te dormir. E só descansava quando acordavas e, ainda meio ensonada, dizias que era o teu mais que tudo. O teu anjo protector. Depois acordavas e gritavas enfurecida por estar acordado. Por te fazer dizer aquelas coisas. As odiosas e abomináveis coisas que desconhecias que existiam. Tinhas sonhos bonitos com certeza. Nunca descobri se sonhavas a cores. Pela forma como os teus lábios se redesenhavam enquanto dormias, como os teus braços se levantavam sentindo as minhas mãos, os meus dedos compridos. Por vezes também te acariciavas. Tentando imitar as mãos de quem sonhavas. De quem suspiravas. Começava a suar e crescias mais um pouco para mim. Eras enorme a dormir. E eu era o teu anjo. Pelo menos era o que dizias ainda ensonada. Pouco antes de ires comprar tabaco.
E eu erguia-me para ti. Para o relevo do teu corpo. E tentava dar sentido ao que restava de mim.



7 Comments:

At 8:17 da tarde, Anonymous Anónimo said...

meko, gosto mt d ler os teus textos...
mt bons mesmo! parabéns!

beijos

Tø SCP

 
At 8:31 da tarde, Blogger R.Santos said...

Obrigado pela visita meko.....Ainda bem que gostaste! :)

 
At 6:08 da tarde, Blogger gm said...

Oh Arafat, não sei se é boa ideia eu ler estes textos, mesmo que os presuma ficcionais eheh
Abraço

 
At 6:16 da tarde, Blogger R.Santos said...

:D

Tudo ficção amigo....Mas,mesmo que não fosse,são fruto da inspiração do momento.Sentimentos passíveis, na minha opinião, de serem escritos....

Obrigado pela visita :)

 
At 3:56 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Já tinha gostado muito deste...
BEIJO
Mãe

 
At 11:39 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Este não é só ficção, Meko...!? LOL
Mas está muito bom, também.
Beijos

 
At 11:46 da tarde, Blogger R.Santos said...

Acredites ou não.....Escrevi isto quando cheguei aos Açores para trabalhar... Ainda mal sabia o que ia acontecer nestes três enormes anos! ;)

 

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