sábado, dezembro 04, 2004

Almar






Esqueço a vida que tenho e levo. Por momentos.
Sei que não o vou conseguir por muito mais tempo. Esquecer a lágrima. A alma da lágrima. O ser assim.
Não tenho culpa de me ter como sensível. De te ter como sensível. Quando se cai, cai-se mesmo. Às vezes é bom cair. E fazer a terapia à alma como deve ser. Palavra nova no dicionário.....

Almar.

O cheiro das azálias deixa-me indisposto. Falam-me de ti. Na esfera dos anjos que acreditam em mim. Sinto o teu pulsar na minha cabeça e no meu antebraço. O pulsar dos anjos em sintonia com as ondas do mar que me traz a alma a reboque. Aos poucos. Para ti.
A última vez que falei contigo cresci um bocadinho. Tinhas ainda o cabelo preso, atado, amachucado das noites de amor. Das nossas noites de amor. O brilho era diferente. O brilho dos teus olhos. Sempre diferente. “ Escusas de me falar de amor....” disseste, à medida que apoiavas os cotovelos na mesa e olhavas para o homem que fumava por detrás de mim. No decote, o teu fio azul, de influências marroquinas a brilhar para mim. “ Escusas de me falar de amor, meu querido....”, dizias enquanto o teu fio brilhava para mim. Há sempre qualquer coisa que usas que chama por mim.
“ Escusas de me falar de amor, meu querido....Sabes bem que detesto lamechices, embora tenha querido provar-te o contrário. Nunca mais me vais ver suar de amor. Nunca mais....”. Disseste.

Dói.

Saímos para a tua carrinha Volvo. Nove lugares. Para os nossos filhos pensei eu, na altura em que ainda pensava na função emotiva das carrinhas. Ter filhos. três ou quatro. Mais tu e eu. Mais o cão grande. Mais amor. Mais amor. Mais amor.
Agora compreendo o teu silêncio. Já não imploro que fales. Que me digas coisas bonitas. E que as sintas quando te falo ao ouvido, ou ao pé da boca, à procura do teu beijo condicionado às palavras que possas ou não gostar. Gostar não. Tolerar. Porque é isso que fazias e fazes. Tolerar. Como a vaca tolera o mosquito no lombo. Estás demasiado ocupada para sentires o que quer que seja. Quanto mais o amor. O amor que engrossa a alma. E a faz suar, transbordar de lágrimas desgarradas de todos os vícios que aprendemos. O ser puro. Tal e qual. A exigência é grande. Deste mundo e do outro. Só eu mesmo.
Cravas-me as unhas na pele para me sentires dar-te prazer. Fulminas-me o gosto, fazes-me fulminar-te o rosto. De desafio em desafio crias em mim o vazio de ter que te amar até ao fim. Porque amar-te é vazio, meu amor. Um vazio dócil que chama o teu nome. Visível apenas porque me dou ao trabalho de o mostrar. De te mostrar. O ponto de retorno é teu. O sonho que mataste é meu. E o chão que pisamos não é o mesmo. Nunca mais vai ser o mesmo. Mas nem tu nem eu o sabemos.

Ainda.







4 Comments:

At 4:02 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Sobre este,e por ignorância,fiz o comentário em directo porque o achei lindíssimo,intimíssimo...
Agora que já sei,deixo-te mais um beijo de incentivo
Mãe

 
At 6:38 da tarde, Blogger R.Santos said...

Obrigado mais uma vez mãe.... :)

 
At 11:52 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Eu não sei. Mas comento. Vê-se que é sentido. Sente-se...Muito bonito. Só isso, Meko, muito, muito bonito.
Beijos

 
At 12:04 da manhã, Blogger R.Santos said...

Não é difícil sentir Meko...Nada difícil.... :)

Obrigado mais uma vez....

 

Enviar um comentário

<< Home

BlogRating